quinta-feira, 5 de maio de 2011

Democracia brasileira no rumo certo!


“Há palavras que carregam o estigma do preconceito. Assim, o afeto a pessoa do mesmo sexo chamava-se 'homossexualismo'. Reconhecida a inconveniência do sufixo 'ismo', que está ligado a doença, passou-se a falar em 'homossexualidade', que sinaliza um determinado jeito de ser. Tal mudança, no entanto, não foi suficiente para pôr fim ao repúdio social ao amor entre iguais (Homoafetividade: um novo substantivo)”. (Maria Berenice Dias, em sua obra “União Homossexual, o Preconceito e a Justiça”, lembrada pelo Minsitro Ayres Britto em seu relatório)
 
Mais uma vez, o Supremo Tribunal Federal (STF) é protagonista de um imporatante debate. A Constituição de 1988 é, novamente, o argumento que trago aos leitores. O tema da vez é a necessidade de reconhecimento legal da união homoafetiva e a consequente outorga de direitos dele decorrente.
 
Começo pelos argumentos contrários. A primeira questão levantada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) é a da "naturalidade" da relação homem/mulher, em oposição à "anormalidade" das relações homoafetivas. A lei brasileira estaria correta, no sentido de que o Art. 226 da Constituição de 1988, parágrafos 3º e 5º, e o Art. 1514 do Código Civil, deixam claro que a instituição familiar é composta pela união de um homem com uma mulher.

O segundo ponto no qual se agarram os religiosos seria o da finalidade "natural" do casamento. Segundo o Código de Direito Canônico, o sentido da união afetiva seria a geração e a educação de filhos e filhas. Portanto, permitir que homem se case com homem ou mulher se case com mulher é claudicar as condições essenciais para a sua finalidade. E vão além, dizendo que "uma união homoafetiva (casamento gay) não pode ser equiparada à formação de uma família", como consta em artigo na página da CNBB. O mesmo artigo afirma, ainda, que "a Igreja considera isso como suicídio da lei natural e dos vínculos sociais que a família estabelece como célula-mãe da sociedade".

O terceiro argumento que trago é o da "imposição" do "comportamento homosexual" sobre os indivíduos. Não estou exagerando. Diz a CNBB, que os homosexuais "exigem impor uma opinião unilateral ao que é irreformável: a lei natural e positiva estabelecida pelo Criador". Nós, cidadãos, não poderíamos aceitar essa arbitrariedade dos infiéis.

Minha contra-argumentação começa voltando a mencionar o relatório do Minsitro Ayres Britto (STF), já citado em epígrafe. Diz o eminente jurista que "o sexo das pessoas, salvo expressa disposição constitucional em contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica". Importante, nos dias atuais, lembrar que homem e mulher dotam de iguais direitos e deveres.

Ora, o objetivo da recente decisão é nada mais que nossa Corte Suprema "declare: (a) que é obrigatório o reconhecimento, no Brasil, da união entre pessoas do mesmo sexo, como entidade familiar, desde que atendidos os requisitos exigidos para a constituição da união estável entre homem e mulher; e (b) que os mesmos direitos e deveres dos companheiros nas uniões estáveis estendam-se aos companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo", como propõe a Procuradoria Geral da República (PGR).

É fato que a homosexualidade, ou as relações amorosas e sexuais entre pessoas do mesmo sexo, sempre existiu ao longo da história da humanidade. É fato, também, que ela começou a ser reprimida, ao menos no ocidente, após a consolidação do cristianismo como religião dominante. Devemos lembrar que tratamos aqui do próprio reconhecimento, por parte do Estado, dos homosexuais enquanto cidadãos, e não de sua aceitação por uma religião A ou B.

Prossegue a PGR: "Com efeito, a superação de certas visões preconceituosas e anacrônicas sobre a homosexualidade, como a que a concebia como 'pecado' - cuja adoção pelo Estado seria francamente incompatível coms os princípios da liberdade de religião e da laicidade (CF. arts. 5º, inciso VI e art. 19, inciso I), - ou a que a tratava como 'doença', hoje absolutamente superada no âmbito da Medicina e da Psicologia, não subsiste qualquer argumento razoável para negar aos homosexuais o direito ao pleno reconhecimento das relações afetivas estáveis que mantêm, com todas as consequências jurídicas disso decorrentes." Ao meu ver, esse pequeno trecho rebate de forma definitiva todos os argumentos levantados pelo segmento religioso.

Faço agora minha crítica pessoal. Ao estabelecer que a família é a "base da sociedade", o Art. 226 da Carta Magna já afronta diretamente o princípio da laicidade! De que modelo de família estamos falando? Não caberia neste texto discutir a concepção marxista de família, enquanto meio de propagação da ideologia dominante. Seria demais, também, explorar o anacronismo da sociedade patriarcal, que encontra seu pilar no modelo de família cristão. O que vale dizer é: se é reconhecido o efeito civil do modelo religioso de união, por que não o reconhecer aos demais? A democracia sai vitoriosa com a decisão do Supremo Tribunal Federal!

(Link para artigo citado: http://www.cnbb.org.br/site/articulistas/dom-aldo-di-cillo-pagotto/897-homofobia)

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